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sábado, setembro 09, 2006

To Really Love a Woman

Uns olhos lindos – verde claro, um sorriso magnífico e um porte esbelto – ficou-se na porta do gabinete – adornando o corredor vazio.
Não fala – raramente inicia uma conversa… fica-se por ali, como não desejando incomodar mas necessitando um olhar… e eu olho, feliz por contemplar.

Hoje estava em baixo, mas a sua beleza merece sempre um comentário – e eu não costumo poupar o belo que se vê sem o partilhar com quem assim me embeleza:

Está linda hoje, os brincos são muito giros… novos não é?”

Não a via desde que terminara os tratamentos, mas é sempre uma brisa quando alguém simpático, interessante, de vida profunda ou beleza irradiante nos visita no gabinete dos dias… tornam o dia mais belo e beleza com beleza se paga.

Vai à consulta? Espero que seja rotina…”
Ando tão em baixo Sr. Enfermeiro” – Dizia ela com a sua voz nasal… hesitante.

Entra – parece mais só do costume. (Como nos sentimos em tantas ocasiões nas que um abraço curaria o mundo e a alma… nas que um silêncio sincero - de quem ouve com o coração aberto – nos faria sentir longe da solidão…)
Sente-se, que se passa?” digo mais alto do normal pela sua falta de audição…
Está a custar tanto…”

(Lembro que fora operada – mais um tratamento nas centenas que passaram o mês passado pela sala… que tinha sido?… algo abdominal, talvez?)

Enquanto a ouço – ouço dentro de mim algo que diz “Mea Culpa”. Neste “Ágape”, declaram-se as culpas do estereótipo masculino que a alma veste, para assim poder celebrar com dignidade… condignamente.

O cirurgião tinha-lhe dito – peremptoriamente e sem dialogar – que “aquilo” era para tirar. Que só servia para ter filhos e que ela já tinha passado dessa idade.
(É tão difícil nascer homem e ancorar a energia feminina suficiente para amar com devoção esse ser lindo que encarna o feminino no seu auge.
Braços para abraçar e mimar, proteger, dar atenção, dedicação, tempo, presença, foco – que seja ela a única mulher no nosso mundo e a mais bela, a mais luminosa, a que é para nós com certeza rotunda e absoluta
…).



Mas – e se eu lhe tivesse dito que lhe ia tirar os testículos – será que ele estava assim tão pedra?! Se soubesse que isto me ia deixar assim”…
(O masculino – na sua versão ainda em desenvolvimento – vira-se para coisas que considera tão “práticas” - que termina por construir um mundo de aparências nas que – o tempo que é medida de qualidade mais do que quantidade – se desfaz em trivialidades.

O masculino não aberto para amparar, para ouvir, para dar tempo a detalhes que são tudo e o que verdadeiramente importa; tão longe por vezes do abraço terno que se oferece a um bebé, na devoção que se aprende ao cuidar – ao mimar a próxima refeição, ao sentir gratidão pela lição de humildade e serviço nas fraldas dos idosos acamados cuidados por saias durante centúrias - ignora o dom da entrega e o amor profundo, simples e devoto que o serviço implica. O feminino sabe…).

Mas é tão diferente… eu amo o meu companheiro actual – ele é mais velho e está a terminar um divórcio litigioso que nos rouba tanta vitalidade.
O amor está cá dentro na minha cabeça – eu sei – mas agora o corpo não responde, não sinto desejo
…”




(Soluções… penso em soluções… tão difícil apenas sentar-se e ouvir… que arte refinada que custa tanto a engolir… fel – estar ali, exposto. Apetece falar, parar aquilo, dizer qualquer coisa: “Abra-se com o seu companheiro – diga-lhe exactamente o que me está a dizer a mim – talvez encontre o abraço que está à procura”… será que isso resulta? A prescrição óptima em palavras… o curador certeiro da alma humana…
Não – as coisas não são assim – o que torna algo importante é o tempo dedicado, a imperturbabilidade da presença que não se arreda mesmo quando dói e a profundidade da dor que se aceita partilhar
).

E eu que fui sempre tão activa – agora não poso parar, logo gora que temos tantas dificuldades pela frente – não posso descair

(Vês?...)

E disseram-me do tratamento de hormonas sim… mas disseram também que posso engordar – e eu não quero ficar gorda, logo agora que estamos no nosso primeiro ano de relação… o médico ainda disse que isso depois passa… mas ele não percebe

(Tão lindo o feminino – quando se dá em gestos de esmero pelo belo que representa o aspecto, quando se sente agradável à vista do amor e recebe os piropos com graça e vida.
Está linda hoje, os seus olhos brilham – e são tão lindos nesse verde. - Ela gostou da nota – Hum – traz uns brincos novos hoje – ficam mesmo bem – E eu tinha dito isto mesmo antes de ela se ter confessado. Isso foi bom – fez com que se risse em tom gasto
).

Agora já custa tanto. O meu filho mais velho deve ter a sua idade” (e tem).
Estão sempre a brincar comigo – Arruma-te, agora já não tens idade para essas coisas.
O mais velho até dizia “Tu antes competias com qualquer uma das minhas namoradas mãe – agora
…” (Ela sabe-se bonita… agora sente-se cansada… gasta… incertezas… susceptibilidades… manter aparência forte).

Os homens são algo distraídos… sabe… às vezes não notam o quanto os comentários em tom de brincadeira, que eles pensam que ajudam, podem ferir”. (O que elas reparam).

Estive casada vinte e seis anos. Não que o meu marido me maltratasse, mas a indiferença dói mais do que muitas coisas…”

(Sei… o masculino tem tanta dificuldade na devoção e no alimento constante do amor. O “principezinho” era criança linda… não era adulto. Se o fosse, a Rosa nunca teria redoma, protector do vento e água todos os dias a horas certas e a primeira coisa que ele perguntaria ao aviador perdido no deserto, não seria por uma ovelha, mas sim por uma guia de estações de serviços).

No Final oferecemo-nos um abraço. Um abraço desses que tocam peito com peito – para nos lembrar apenas o como todos os corações estão entrelaçados…

Fica aqui a música que ecoou na minha mente, enquanto ela voltava para a sala de espera… é para todo o feminino que ainda não aprendi a abraçar.

"Have you Ever Really loved a Woman" - Brian Adams

To really love a woman
To understand her you gotta know her deep inside
Hear every thought, see every dream
N' give her wings when she wants to fly
Then when you find yourself lyin' helpless in her arms
You know you really love a woman


When you love a woman you tell her that she's really wanted
When you love a woman you tell her that she's the one
'Cause she needs somebody to tell her that it's gonna last forever
So tell me have you ever really really really ever loved a woman


To really love a woman
Let her hold you 'til ya know how she needs to be touched
You've gotta breathe her, really taste her
'Til you can feel her in your blood
N' when you can see your unborn children in her eyes
You know you really love a woman


When you love a woman you tell her that she's really wanted
When you love a woman you tell her that she's the one
'Cause she needs somebody to tell her that you'll always be together
So tell me have you ever really really really ever loved a woman


You got to give her some faith, hold her tight
A little tenderness, gotta treat her right
She will be there for you takin' good care of you
You really gotta love your woman


And when you find yourself lyin' helpless in her arms
You know you really love a woman


When you love a woman you tell her that she's really wanted
When you love a woman you tell her that she's the one
'Cause she needs somebody to tell her that it's gonna last forever
So tell me have you ever really really really ever loved a woman


Yeah
Just tell me have you ever really really really ever loved a woman
Oh
Just tell me have you ever really really really ever loved a woman


P.S - Hoje foi dia de Almodóvar e de "Volver" - um feminino engraçado num olhar sobre coisas bem sérias. Há femininos com rosto de Homem...

1 comentário:

Micas disse...

Mais um texto muito intenso onde a carga emotiva é demasiado forte. São estes "ossos do ofício" que nos deixam a pensar que não é por acaso que essas pessoas foram colocadas no nosso "caminho"...

Bem Haja por andares por aqui.

Abraço desde a Germãnia, agora com sol de verão tardio :)