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quarta-feira, janeiro 31, 2007

Desde o fundo do coração...


Tenho assistido, com algum cepticismo, ao desmoronar dos valores ditos “clássicos” e ao dealbar de uma “nova era”.
Tenho ouvido os discursos retóricos que anunciam todas as vantagens e benesses que esta “era dourada” implantará.
Tenho visto as convulsões que acompanham o arrancar de raiz do velho mundo – em prol dos ideais de igualdade, liberdade e fraternidade.
Tenho observado como se pintam os derrotados de negro e se tingem as vitórias sangrentas em tons rosa.

Compreendo os argumentos apologistas da compaixão sobre quem é inculpado de crimes, apresentando-se à sociedade como vítimas de injustiça social por parte de uma legislação tirana e “bota de elástico” e que raramente alguém ousa já cumprir.
Assim sendo – mude-se a lei…

Enquanto estes argumentos velhos vão sendo relembrados, observo os mil e um casos publicitados de abandono, maus tratos, confusões de paternidade e afins, antes e durante um processo que é suposto ser isento e que apela à consciência de cada um.
Os mass-média servem um senhor bem ardiloso, o marketing é o seu negócio e o subliminal a sua arte.

Conheço as razões políticas que geram referendos, tal como sei como havia quem lavasse as mãos para ditar sentenças – como se isso levasse a responsabilidade das decisões e poupasse votos a estes ou aqueles; votos oriundos de camadas ditas mais “conservadoras”, mas ainda bastante numerosos numa cultura “enquistada” em valores “à antiga”.

A Lei e os Homens… qual dos pilares será pintado para se adequar às formas estilizadas do novo templo?

Senhores, por muito que compreenda a decisão pessoal de cada indivíduo face à sua própria soberania e identidade.
Por muito que entenda a miséria e a dor de se nascer humano.
Não compreendo que a lei se desfaça do seu pendor de guia para cobrir a falha e transformá-la em dom. Dito de outra forma, se erramos, não é disfarçando o erro através da mudança do termo que o define, que vamos terminar com o erro em questão.
“Mea Culpa” aqui.



Era época passada na que outros dispunham da vida alheia para sacrifícios e rituais, para satisfazer deuses e deusas, para tudo e algo mais.

Certo é que, actualmente, apenas mudamos os nomes das coisas.
Uns são vítimas de terrorismo e outros danos colaterais.
Talvez a pressão económica seja tanta que já estejamos no ponto de dar e vender o corpo e o sangue em troca de melhorias no estatuto, de forma a que a riqueza flua profusa - como nesses outros tantos países que tão incansavelmente se citam como exemplos de coisas civilizadas, desenvolvidas, industrializadas ou sei lá bem o quê… como se isto classificasse humanidade.

Uns invocam o seu saber para dizer que vida é assim ou assado, uma coisa ou um ser, que a personalidade se forma a partir de tal ou qual semana. Vaidade e ignorância a dançar alegremente a dança do desalinho…

As leis existem não para penalizar – mas para orientar, proteger ou até redimir talvez.
Se não, teríamos castigo mais do que justiça. Certo.
Fomos mudando o código básico e criando um alternativo, mais à medida. Vamos ver.
Nesta viagem de tentativa e erro, talvez estejamos a pisar linhas demasiado vitais para serem abolidas ou simplesmente ignoradas.

Penetrando o contexto da linguagem sibilina da pergunta do referendo de Fevereiro, pensemos:

Se o “Sim” ganha, demorará o mesmo período de tempo a ser desenvolvido um novo referendo para ver se as pessoas querem um “Não” novamente? Deixem que ponha as minhas dúvidas
Se o “Sim” ganha, haverá nova recontagem de tempo para aumentar as 10 semanas… digamos que para 12, 15, 20? Talvez a ciência dê uma ajudinha e cheguemos lá.

Pergunto-me também sobre quanto tempo passará até uma nova proposta de referendo em caso de haver vitória do “Não”.



Agora, sejamos francos.
O referendo é aleatório; é a consciência de cada um, assim como os valores que norteiam a nossa existência que estão em causa.
Enquanto uns polarizam a questão para um lado e outros para o outro: entre feministas e católicos com políticas oportunistas de entremeio – a pergunta é para o teu ser, não para a lei.

Podemos mudar a lei a qualquer momento (fazemos isso constantemente), como podemos mudar o nome de algo (como embrião e feto) e pensar que se atinge um qualquer descanso existencial com trocadalhos do carilho.

A questão é mais – quem és, em que crês, que valores trazes no teu coração?

Sabemos quando erramos – e todos erramos; por isso estamos aqui, diariamente lutando para dar e fazer o melhor, errando e novamente procurando levantar.

No entanto, algo ameaça a consciência do erro; algo ameaça quebrar as linhas orientadoras que nos levam a caminhar numa direcção e sentido. Por muito indefinidos que estes pareçam à mente embriagada de si mesma.

Lenta e imperceptivelmente, caminhamos para a apatia total, para uma anestesia de seres máquina desempenhando tarefas, desprovidos de consciência e valores.

Algo ameaça com apossar-se de tudo – terminando na própria vida.

Por muito que compreenda as opções pessoais de cada um, se me questionam acerca da legislação e se esta deve ser omissa relativamente à defesa da vida – respondo “Não”. Por muito hábil, subtil e amenizadora de consciências que a letra possa parecer.


Agora, já sei que cada pessoa fará as suas opções, cometerá os seus erros ou encontrará o seu centro ao caminhar.


De certo que nos países “liberalizados” existem os mesmos dramas relativamente a crianças nascidas em meios sociais depravados, abandonadas; mulheres oprimidas e homens irresponsáveis… e também existirão todos os casos simétricos aos descritos. Aqui não mora a questão, apenas os fogos de artifício.

A questão aqui são os valores que cada um traz dentro e de que forma lutará para os fazer valer. A questão aqui é saber quais são esses mesmos valores e de que forma queremos que sejam representados para o bem comum.

Se um só ser humano tem o poder de julgar sobre a vida e a morte… então estamos numa idade estranha…