Depois do perto, vem a distância…
Estive lá em corpo… continuo lá em alma.
Pelas suas gentes, pela humanidade dessas gentes…
Pela vida simples, pela verdade dessa mesma vida…
Pelo sentido de pertença – à terra, à família, à tradição…
Por todas as pessoas – livres e ousadas – que por lá ficaram…
Porque, no Tétum, os tempos verbais estão sempre no agora.
Porque, nas famílias de Timor, tudo se partilha – nada é de um só…
Agora, depois de caminhar nas névoas – muito densas e frias – das terras de Sua Majestade, regresso a terras Lusas (que já o foram mas não o são mais)…
A partir daqui, darei ao blog lembranças, pedaços que comigo trouxe da outra margem.
Darei presenças daqui – os ecos do caminho de Santiago, as pedras de granito das fortalezas e lugares antigos do meu Minho familiar.
Vozes de Lisboa, pois lá estarei nuns dias…
E – depois – espero voltar a levantar voo e voar – para onde - ainda não sei.
Mas, como o Régio “… não sei para onde vou, não sei para onde vou – mas sei que não vou por ai!!”.
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sexta-feira, maio 13, 2005
Terra colonizada, invadida. Vietnam para os internacionais, onde o povo luta uma guerra de guerrilha - silenciosa mas constante - com aqueles que lhes roubam o país às postas, debaixo sempre das boas intenções de quem parece procurar apenas o bem estar e desenvolvimento de quem é menos desenvolvido ou civilizado. Aqui, um Timorense senta-se em frente do terreno proibido da entrada de um supermercado que - como é costume - é de propriedade Australiana e - com preços privativos para qualquer local - apenas serve os Malae
Onde a fé é vivida twenty four seven e não apenas aos Domingos entre as nove e as onze da matina. Onde os padres são também revolucionários e os Bispos presidentes de coração. Com base animista, esta gente não poderá viver vidas fraccionadas, onde se é alguém das 9 às 17 e outrem até à noitinha. Religiosidade é una e faz parte de toda a vida do povo. Animista nas montanhas, mistura nas aldeias de Oe-Cusse, aparentemente católica na capital
Onde o tempo passa, entre cartas, tabuleiros de xadrez onde se jogam damas e pools espalhadas um pouco por aqui e além, numa cidade que quer viver ao seu ritmo pacato mas que se vê constantemente empurrada a entrar no frenesim Malae. A maldição do petróleo e a desgraça de ser ponto estratégico entre os novos vermelhos e os das barras e estrelas roubam a independência a qualquer um enfim.
Onde as crianças são mimadas o tempo todo (nem imaginam como é difícil retira-las desta veste canguru para as pesar e medir nas consultas - elas berram e estrebucham se ficam longe dos pais). Onde o pai, irmão e outras crianças passam tempo infinito a cuidar e brincar com os mais pequenos (sem necessidade de leis de protecção à paternidade e coisas afins). Onde brincar com uma criança nas ruas de pó e pedra não levanta as suspeitas dos vizinhos e onde não se vive o medo de que as crianças sejam abusadas ou maltratadas, como temos vivido nós nestes tempos de doidos nos que - olhar crianças na rua - já começa a ser um perigo e pode descambar numa caça às bruxas. Enfim saudades da vida simples, digo eu!
Saudades de um lugar onde a moralidade das gentes ainda é bela o suficiente para não restringir a beleza humana em toda a sua ternura e afectividade. Onde todos são mano ou mana de alguém e onde os mais maduros são tio ou tia de toda a gente. Onde homens e mulheres andam de mão dada com os seus congéneres e onde abraços são sempre recebidos com um sorriso mais do que um olhar de reprovação. Ainda me rio só de pensar da primeira vez que encontrei um director de posto de saúde que me passeou pelas instalações e me deu o discurso de boas vindas de mão dada comigo o tempo todo he, he - e eu sem jeito a tentar sentir-me à vontade. Enfim - memórias lindas.
As faces de Isis
Por coincidência, esta jovem de Timor tem Isis na sua lapela. A sua consola play station ou boneca Barbie se resume aos elásticos com os que se inventam milhares de brincadeiras junto das outras crianças de Bandudato - distrito de Aileu - ao teclado do meu novo lap top já tenho saudades desta vida verdadeira, deste tempo simples
quarta-feira, maio 11, 2005
Dia seguinte estou novamente no campo... desta vez "country side" a 45 minutos de comboio de Manchester. A Emma - amiga do caminho de Santiago de à dois anos atrás - enquadra o cenário presidido pelas ovelhinhas lanzudas aqui da zona. Amigos - está um frio de rachar! Saudade da temperatura de terras de Timor!...
Ok - o cartaz diz tudo. A Torre de Londres era o lugar onde os nobres choravam tanto como os pobres... justiça emaranhada que tinha "beef-eaters" como guardas. Ha muito la dentro, incluindo joias de coroas que fazem os sonhos de mil e uma noites de muitos. Pergunto-me onde está a simplicidade da minha montanha... ai - saudade!
St. Paul's cathedral - um símbolo da II guerra mundial - entre o fumo dos bombardeiros Nazis a cúpula da catedral ergueu-se incólume. Na entrada, uma enorme porta rotativa deixa ler em letras enormes "This is the house of God and THIS is the gate to Heaven". Um par de metros mais à frente um cartaz adverte - entrada: adultos - 8 libras; desempregados - entrada gratuita... afinal o sermão da montanha sempre era verdade e - os pobres - vão herdar o reino dos céus - ainda que, com a rainha Victoria de ceptro dourado na mão, ninguém diria que a igreja - protestante ou não - seja muito dos pobres... enfim.
Trafalgar Square - onde o homem que vence Napoleon admira a paisagem guardado por enormes leões de bronze e dando as costas ao museu de artes pictóricas. Montes de autocarros vermelhos cruzam a rua e eu lá sigo o meu devaneio de início de manhã - procurando por toda a parte as minhas gentes simples e a vida pacata de outrora sabendo que - agora - ela já mais não volta...
Westminster... bem ao lado das casas do parlamento. Os manifestantes já aqui estão desde - pelo menos - Março do ano passado (quando aqui estive da última vez). Hoje, as bandeiras da commonwealth não estão presentes. Ao lado direito, uma estátua de Churchill contempla o cenário, enquanto três "bobbies" passeiam entre miriades de turistas que sobem e descem dos típicos autocarros de dois andares descapotáveis... mesmo complexo para este "alienígena" de terras Lorosae.
terça-feira, maio 03, 2005
Policia local de um lado, santos e populares do outro. No estrado padres resistentes, Ramos Horta e Xanana falam ao povo, procurando solucionar uma situacao que ninguem entende mas que marca estes ultimos dias. Policias da U.N, observadores militares vao-se misturando entre a multidao... que vai ser de ti Timor, se te viras contra ti mesmo? Quem te quer assim dividir?...
O Adeus
Que posso dizer?...
O tempo chegou ao seu fim.
Nas ruas – mesmo sendo uma da manha – musicas varias entrelacam-se com canticos religiosos enquanto a “manif” - teoricamente suportada pela igreja local - segue na sua “teimosia” de nao abandonar as ruas enquanto reivindicacoes imprecisas nao forem respondidas...
Temos outra vez arame farpado nas ruas, temos de novo ameacas sobre as multidoes... mas desta vez sao Timorenses frente a Timorenses – a de o mundo ser redondo algum dia ou estaremos num planeta de seres e ideologias quadrados?...
Deixo esta terra sem quase tempo de respirar (e tambem eu rezo para que – amanha – nao se confirmem os receios de confusao e possa recolher o meu visto e passaporte no ministerio do interior local). Mas – em cinco minutos de tempo para respirar - senti um vazio e uma saudade tamanha... so de pensar em partir daqui, em regressar para la...
Daqui levo as raizes deste povo. A admiracao por quem sabe ser quem e, onde pertence e – sobretudo – o que e a independencia (e nao falo de politicas ou paises, mas a independencia, o orgulho e ousadia de se ser ainda humano).
Daqui levo sorrisos de crianca como nunca vi, liberdade como nunca vivi. Levo o ter estado longe dos grilhoes de um dia a dia conhecido durante o tempo suficiente para ter entendido que ainda existem seres humanos livres...
Agora resta o conformar-se com a ideia do regresso a Portugal e ir acarinhando o sonho de voltar aqui.
Talvez algum dia... talvez.
O tempo chegou ao seu fim.
Nas ruas – mesmo sendo uma da manha – musicas varias entrelacam-se com canticos religiosos enquanto a “manif” - teoricamente suportada pela igreja local - segue na sua “teimosia” de nao abandonar as ruas enquanto reivindicacoes imprecisas nao forem respondidas...
Temos outra vez arame farpado nas ruas, temos de novo ameacas sobre as multidoes... mas desta vez sao Timorenses frente a Timorenses – a de o mundo ser redondo algum dia ou estaremos num planeta de seres e ideologias quadrados?...
Deixo esta terra sem quase tempo de respirar (e tambem eu rezo para que – amanha – nao se confirmem os receios de confusao e possa recolher o meu visto e passaporte no ministerio do interior local). Mas – em cinco minutos de tempo para respirar - senti um vazio e uma saudade tamanha... so de pensar em partir daqui, em regressar para la...
Daqui levo as raizes deste povo. A admiracao por quem sabe ser quem e, onde pertence e – sobretudo – o que e a independencia (e nao falo de politicas ou paises, mas a independencia, o orgulho e ousadia de se ser ainda humano).
Daqui levo sorrisos de crianca como nunca vi, liberdade como nunca vivi. Levo o ter estado longe dos grilhoes de um dia a dia conhecido durante o tempo suficiente para ter entendido que ainda existem seres humanos livres...
Agora resta o conformar-se com a ideia do regresso a Portugal e ir acarinhando o sonho de voltar aqui.
Talvez algum dia... talvez.
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