pub

sexta-feira, março 17, 2006

The Way


O caminho… o caminhante… novamente… Errante… Corrigindo o erro de não caminhar...

Depois de dois anos separados (ou caminhando lado a lado em silêncio), voltamos a nos encontrar…

Encontrando-nos reunimos de novo – eu em ti, tu em mim - montanhas pirenaicas, gentes impossíveis de todas as partes e sem parte alguma que não seja sua por direito…

Encontrando-nos – nós liberdades de quem voa –caminhos que conduzem a dentro, ao conhecer do que somos, em companhia dos livres - que se atrevam a ir além da rotina de si e se entregar…

Nós ecos pirenaicos que ressaltam entre granitos mágicos, e voam por casas de pedra Navarra, e correm frente a Touros de terras panplonicas…


Nós, vilas e aldeias perdidas na meseta, com casotas de tijolo e velhos que languidecem baixo um sol eterno em cruzes templárias de templários loucos escondidos nas montanhas…


Ecos… somos ecos de pisadas que passam…suponho que cada qual terá o seu… o eco dos mistérios nas muralhas de Ponferrada, nas igrejas Joaninas de Castrojeriz…


Ecos de florestas druidicas, com sombras milenárias entre o Lugo dos carvalhos, mesclados entre névoas milagrosa de capelas do Cebreiro…

Ecos em pedras místicas de igrejas encriptadas, ecos em gentes de outros lugares através de linguagens singulares, ecos na simplicidade de se partilhar o pão… todos finalmente irmãos… apenas…Ecos… tantas vozes… em mim…


Comecei a caminhar já há algum tempo…

Determinar a ida é um passo do próprio caminho…

Lutar as férias necessárias para o trilhar por inteiro – uma outra aventura…

Escolher e mimar os materiais que serão companheiros de viagem – a mochila (quente amiga em costas gélidas de vendavais, neve e chuvas), botas (senhoras do nosso agrado ou pesar, ao se palmilhar as pedras milenares), impermeáveis e afins…
Goretex, trekking, coolmax… estrangeirices que nos vão mergulhando na multiciplicidade do que se avizinha…

Preparar a viagem, deleitar-se tocando com imaginação fértil as curvas sensuais do caminho amado… lendo e vendo fotos de lugares que cedo pisaremos com nossos próprios pés.

Divertir-se já com as peripécias dos horários – ver o quanto vamos dormir nesta ou naquela estação de comboio por forma a chegar ao lugar para iniciar um deambular rumo a Santiago… ou Finisterra… ou mais além…

Começar a caminhar – mochila às costas – por serras e vales, umas horas por dia; treinando a disciplina necessária para continuar caminho sem se desviar, reconhecendo a cruz que se faz prazer ao caminhar moldando a nossa peugada ao caminho…

Mudar horas de sono, comidas… e – sobretudo – forma de me sentir no mundo…

Sou de novo peregrino, estou de novo a caminhar, tenho novamente sentido… novo, renovado… vivo!


Deixo atrás o barrigudo burguês em rotina acamado, na Internet ancorado como num porto de fuga, perseguindo chocolates emocionais para anestesiar a dor de não pertencer a isto… de não ser daqui.

E vou…

Ontem estive com um amigo em Vigo.

Esquecera os bilhetes de comboio no balcão do “El Corte Inglês” onde comprara a guia do caminho… tive de lá voltar…

Depois de recuperar os meus bilhetes para um mundo mais à medida, lá marquei encontro com ele num pub – para conversar um pouco… ele foi deixado pela companheira à dois dias…

No meio do trânsito em hora ponta, deixei o carro no primeiro “Parking” disponível, em redor das Camélias…
Aquilo fechava à 22.30h… tinha duas horas… supus ser suficiente… hehe – já estão a ver que não foi e que fiquei sem poder regressar a casa até hoje de manhã… caminho é mesmo assim… mais do que aquilo que se esperava – desenha-se e revela-se no inesperado.
O nosso papel é ousar seguir, ir, ver o que nos mostra…

O Lain (o tal colego) nunca mais terminava de instalar um Windows no PC de alguém que – depois – soube ser o namorado de uma garota que eu conhecera no passado, lá em Vigo… mundo pikininuuuuuuuu!

Entretanto ia degustando o ambiente.
Eu já de botas de Goretex e calça-calção apreciava a bicharada citadina viguesa…
No meio de um pub de “pinta” sentia o contraste do meu “look”… e gostava do formigueiro que provocava a diferença… ousar… ser… ir… caminhar.


Estava “Entre dos tierras”… degustando uma cerveja de importação, num pub de madeira e veludo, lendo Gabriel Garcia Marquez, olhando-os a eles e elas – os seus gestos, os seus olhares – entrelaçando-me com eles sem que se precatassem, sentindo e usurpando parte daquele festival de pierrots e arlequins…

Outro eu estava já de partida – de botas e calças de caminhar - caminhando para algures que não aqui… passando pela vila mais estranha e bizarra que já pisara nos mundos do meu espírito errante - vila de vozes e sorrisos na noite, de olhares pétreos e sons baços no dia…

Ele apareceu depois de mais de uma hora… falámos.

Se algo ressalta da geração de gentes com as que ainda me dou ou com quem partilhei aventuras e outras tantas que não… é que somos inadaptados

Por muito que nos esforcemos para fazer de conta, para procurar enganar-nos (em primeiro lugar) ou de corresponder às expectativas (de quem nos ama e de quem nem por isso)… não estamos lá.


Aquilo não nos diz nada.

As nossas histórias são essas – de estar a andar por andar se andamos para onde e como outros nos dizem.
Andar em rodopios, andar errando, andar parados, andar sem jeito, sem ir a nenhum lado, só andar


De ser revoltados com algo – se calhar com tudo – porque nada parece bater certo, nada nos diz respeito… andar sem rumo, andar sem meta, só andar

Desde que despertamos para nós mesmos, quando deixamos de viver a vida por imitação, não mais pagando impostos para ser um mais do rebanho – então sentimos…


Não se quer crescer, não se quer vender a alma por tanto de nada, não se pretende manter o círculo à custa de outros que se façam iguais

Marionetas em teatro alheio… pés caminhando sem horizonte, pernas avançando sem olhar, corpo movido sem alma, cordas que puxam, membros em convulsão, peças de um lego caótico, cubismo vital, mapa vazio seguido sem cessar…


Filhos de ninguém –pais de faz de conta –gente que trilha caminhos bravios, terras de baldio… parando ocasionalmente baixo sombras agrestes – em momentos fugazes, vemos paisagens desde as colinas elevadas onde nenhum rebanho costuma pascer…

Quando vencidos pela “normalidade” dos números, rodopiamos em espirais - teatrais – de estertores lívidos; cobiçamos veladamente os finais mais bizarros para uma obra cuja partitura – para nós – não existe…

Incapazes de cair na cadência extática – formalmente disseminada pelo grande grupo – namoramos mortes simbólicas em opiáceas fugas que nos projectem para lá deste lodo de construções fictícias… passamos os dias – conscientes - em mundos de faz de conta para não permanecer – inertes – num sonho de uma noite de Verão



Caminante no hay camino… se hace camino al andar…

3 comentários:

Paulo Jorge Ribeiro disse...

O texto é formidável e as imagens muito bem escolhidas.
Parabéns! Boa caminhada.

marta* disse...

n deu a musica :S

boa caminhada :)
beijinhos

CSal disse...

....
e rumas na paisagem dominado pela cor
três trapos p'rá viagem
um cesto um cobertor
impostos declarados
a alma decretada
passaporte conforme
e um pão

e gritas ao silêncio
e vai saber-te bem
gritar sob os comboios nas pontes quando passam
ficaram tantos tipos
olhando pela janela a sua própria vida
tu não!...

Boa caminhada e bons gritos