O curioso do Fozzie é que, inevitavelmente, procurava encetar conversa com os seus interlocutores utilizando a mesma pergunta: “Porque é que a galinha atravessou a estrada?”. Inevitavelmente obtinha a mesma resposta – um certo desprezo… ai ai, se os sábios fossem apreciados pelo que são e não pelo que deveriam ser, que mundo mágico e de cores garridas seria este!
Hoje, ao circular de forma acelerada pela via rápida - em direcção a um objectivo impossível - esta personagem cruzou a minha mente enquanto um amigo conduzia apressado e chateado para me levar a bom porto.
“Vou fazer-te a pergunta mais importante da tua vida, concentra-te para dares A resposta certa”.
Para quem corria o risco de chegar atrasado a um compromisso altamente importante e inadiável (tretas que cada vez ganham mais valor nas nossas vidas e que nos retiram cada vez mais tempo e prioridade para o que realmente importa) a pergunta pareceu completamente fora de contexto… mas ele lá se aprontou para aparentar que se concentrava e se esforçava ao máximo por dar uma resposta coerente.
“Porque atravessou a galinha a Estrada?”
A resposta que dei não facilitou muito a coisa… apenas a informação contextual começou a abrir alguma brecha na sua carapaça de preocupação. Logo, nova pergunta de orientação dos seres lógicos e racionais:
“Porque atravessamos a existência?”…
Bem, de certo que, “Para chegar ao outro lado” pode resultar uma resposta coerente e – por isso - o meu tom de conversa deve ter penetrado no universo das coisas coerentes, lógicas, com sentido e – talvez – com alguma dose de inovação e genialidade (a modéstia pode ficar para depois, já que há a consciência de que “sintonizo” pensamentos sem que seja eu necessariamente a emissora que os colocou no ar).
Havia algumas galinhas que – como reza a história – procuravam cruzar para o outro lado. Uma delas, por força de vontade, definiu a parede divisória entre as faixas de rodagem como primeira meta para a sua aventura. Olhou, definiu e avançou a ferro e fogo - ignorando todos os sinais de alerta que o seu ser poderia inventar.
Houve um clarão, houve um momento no que tudo muda e, simplesmente, muitas penas a voar no ar no local onde o camião arrastou o galináceo para a sua existência no infinito…
A galinha nº 2 era bem diferente. Estudara no aviário mor, sabia de gingeira o código de linguagem canino, caprino, ovino e até alguma nomenclatura dos teimosos gigantes de duas pernas.
Analisou a situação, observou as duas faixas de rodagem, a linha separadora com o seu muro. Calculou a velocidade média das viaturas, diagnosticou as probabilidades de passar incólume por entre o asfalto…
Logo ali ao lado descobriu uma passagem aérea destinada a peões, encaminhou-se célere para tal lugar, subiu os degraus da glória, atravessou a via rápida e… prontos… atravessou!
Uma sensação de vazio invadiu a viatura. No entanto, como sempre, há uma terceira galinha, uma terceira via, um terceiro caminho, uma forma diferente de fazer as coisas…
A galinha nº3 era curiosa… bizarra até.
Determinada como a primeira, inteligente como a segunda e – mesmo assim – bastante igual a si mesma. Entra pela faixa lateral, sobe até à linha média – a dos tracinhos descontínuos – coloca as patas coriáceas bem afiançadas no asfalto quente; saca um lencinho vermelho de entre as penas e, de repente, começa a ondular.
Vem o primeiro carro, 110 km/h. Olha-o de frente, fixa a grelha frontal e… “Olé!” -passe mortal virando costas - enquanto a viatura desliza no espaço que se perde para além do horizonte; nova viatura, passe lateral, pata cruzada com deslizar suave e lenço sobre a crista da mesma cor encarnada ou vermelho paixão… “Olé!”.
Aumentam os carros, hora ponta para ir ao trabalho e a galinha cada vez mais entusiasta a fazer “Olés!” deslizando por entre o asfalto numa dança na que apenas ela ouve a música.
Não sei se esta galinha atravessou a estrada ou de que forma terminou o seu percurso. De certo que os “Olé!” que arrancou ao espaço silencioso, ao eterno vibrar, mereceram ovações de júbilo dentro da estrutura da realidade.
Certas questões abrem brechas na parede de certezas com a que se vive o dia a dia. De certo que uma galinha dançarina e toureira faria o Universo duvidar… e sorrir.
"OLÉ"!
Um abraço almas peregrinas, até logo!
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